25 de outubro de 2011

Peter Burke e a Escrita da História

No capítulo "A história dos acontecimentos e o renascimento da narrativa", Peter Burke propõe-se a analisar as diferenças entre as narrativas da historiografia contemporânea, constatando que a narrativa histórica, em um sentido bem estrito, está realizando uma espécie de retorno ao relato. 
Burke afirma haver uma oposição entre os historiadores que consideram as estruturas mais seriamente que os acontecimentos - como Braudel - e aqueles que continuam a acreditar que a função do historiador é contar uma história dos acontecimentos. Nesta campanha, ambos os lados estão agora entrincheirados em suas posições, mas cada um deles tem feito algumas observações importantes à custa do outro (p.330). Burke menciona os historiadores que contam histórias e os historiadores que se preocupam com as estruturas. Aponta os limites e as diferenças entre a narrativa tradicional e a história estrutural, valendo-se da contribuição de Laurence Stone e de Simon Schama sobre a tendência do retorno da narrativa na historiografia.

Burke discute a possibilidade de uma nova forma de escrever história. Considera que as formas existentes encontram-se “inadequadas aos nossos propósitos” (p.336). Afirma que algumas inovações literárias apresentam “ soluções para problemas com que os historiadores há muito vêm lutando” ( p.336).
Assim, Burke sugere aos historiadores 1) que contem a história com mais de um ponto de vista, praticando a heteroglossia; 2 ) que pensem na possibilidade de outras interpretações, além daquela que o historiador escolheu para o momento; 3 ) que adotem um novo tipo de narrativa para “fazer frente às demandas dos historiadores estruturais, ao mesmo tempo em que apresenta um sentido melhor do fluxo do tempo do que em geral o fazem suas análises” (p.338).
A última sugestão é o tema principal do capítulo em questão, informa-nos Peter Burke. Recorrendo a Clifford Geertz e a sua descrição densa, afirma: “ O problema que eu gostaria de discutir aqui é aquele de se fazer uma narrativa densa o bastante, para lidar não apenas com a sequência dos acontecimentos, mas também com as estruturas - instituições, modos de pensar, etc - e se elas atuam como um freio ou um acelerador para os acontecimentos” (p. 339).
Burke insiste nos exemplos vindos da narrativa literária, verificando os efeitos do contar a história particular de um indivíduo, ao mesmo tempo em que é narrada a profunda mudança social ocorrida no tempo narrado. Nessa medida, diz Burke, “ os historiadores teriam de desenvolver suas próprias técnicas ficcionais para suas obras factuais ( p. 341).

Nesse sentido, já há algumas resposta ou tendências esboçadas pelos historiadores. Burke destaca quatro delas: 1) a da micro-narrativa histórica. “É a narração de uma história sobre as pessoas comuns no local em que estão instaladas” (p.341); 2) a história narrada entre os mundos públicos e privado, semelhante à abordagem de Jonathan Spence da História da China, em que os acontecimentos e as estruturas são apresentados com mais intimidade; 3) a história escrita de frente para trás [media res] em que o leitor pode sentir a pressão do passado sobre os indivíduos e os grupos; e 4) a história do relacionamento dialético entre os acontecimentos e as estruturas, marca da obra de Marshall Sahlins, em que “no processo de incorporação dos acontecimentos a cultura é reordenada” ( p.346).
Peter Burke não deixa de considerar as importantes contribuições da história estrutural, evidentes na expansão do tema histórico e na defesa do ideal de história total. Contudo, essa prática historiográfica perdeu ao abandonar a narrativa, razão pela qual alguns historiadores contemporâneos usem muitos exemplos retirados da literatura e do cinema.
BURKE, Peter .   A história dos acontecimentos e o renascimento da narrativa” . In: _________ (org.) A escrita da história. São Paulo: UNESP, l992. p. 327 a 348






11 Comentários:

Anna Paula Boneberg disse...

Beth, parabéns por esse ótimo texto sobre Peter Burke. Compartilhei no facebook. Teu blog está muito bom! Grande abraço.

Elizabeth Torresini disse...

Anna, agradeço. Se quiseres mais indicações sobre esse tema - a escrita da História - estou à disposição.
Um grande abraço.

Guilherme Veras disse...

Olá Dra. Elizabeth,
Estou no 2° semestre do curso de História.
Gostaria de entender o que é uma história estrutural, das estruturas??
Gostaria que vc me desse uma luz.
Grato.
Guilherme Veras.

Elizabeth Torresini disse...

Guilherme, o melhor caminho para pensar em estruturas é detectar as experiências ou vivências humanas se mantêm por muito tempo,alterando-se lentamente. Essa História também é chamada de longa duração. Dependendo da época, os historiadores escolhem para estudar as experiências humanas de mais longa duração. Assim, já foram analisadas como estruturas permanentes a economia,as mentalidades, as práticas culturais e outras. Braudel tem importância nesses estudos justamente por ter definido esses fenômenos de longa duração (estruturas), comparando-os com os fenômenos de média duração (conjunturas) e de curta duração (fatos). Se quiseres trocar ideias comigo, estou à disposição. Só hoje vi o teu comentário, por isso não escrevi antes. Saudações, Elizabeth

Unknown disse...

ola Elizabeth sou estudante do 1ºperiodo de História gostaria de uma breve compreenção sobre esse livro.Obrigada

Elizabeth Torresini disse...

Claudio, o livro A Escrita da História, de Peter Burke, é uma coletânea de estudos sobre a Nova História organizada por ele. Na Introdução, Peter Burke discute os limites da História tradicional, apontando algumas possibilidades de mudança desse paradigma. Os capítulos, assinados por diversos historiadores, tratam das mulheres, da micro-história, da leitura, das imagens, do pensamento político, do corpo e do renascimento da narrativa, formando um conjunto interessante de conhecimento sobre o passado cultural de diversos grupos e experiências. Conforme Burke, "o que essas abordagens têm em comum é sua preocupação com o mundo da experiência comum(mais do que a sociedade por si só) como seu ponto de partida, no sentido de mostrar que o comportamento ou os valores, que são tacitamente aceitos em um sociedade, são rejeitados como intrinsecamente absurdos em outra". Em outras palavras, esses historiadores estudam a história dos que não foram objeto da história tradicional, enfatizando a experiência comum cotidiana. Trata´se de um belo livro sob o ponto de vista cultural.
Espero ter ajudado!
Elizabeth Torresini

Programa Shekinah disse...

Peter Burke e a Escrita da História ~ Métodos da História boa noite gostaria que vc mim fornece-se um breve resumo do capitulo história das mulheres,leitura das imagens de Peter B.

Anônimo disse...

Me ajude a entender a micro história conforme relatada nesse livro.

Unknown disse...

quais eram as quatro formas de observar para ele.eu sou do 7 ano e nao estou consiguindo achar por favor me fala pressiso muito dessa resposta

Elizabeth Torresini disse...

Burke destaca quatro tendências de narrativas da história: 1) a da micro-narrativa histórica. “É a narração de uma história sobre as pessoas comuns no local em que estão instaladas” (p.341); 2) a história narrada entre os mundos públicos e privado, semelhante à abordagem de Jonathan Spence da História da China, em que os acontecimentos e as estruturas são apresentados com mais intimidade; 3) a história escrita de frente para trás [media res] em que o leitor pode sentir a pressão do passado sobre os indivíduos e os grupos; e 4) a história do relacionamento dialético entre os acontecimentos e as estruturas, marca da obra de Marshall Sahlins, em que “no processo de incorporação dos acontecimentos a cultura é reordenada” ( p.346).

Unknown disse...

Como se deu esse processo de " volta da narrativa " e qual o papel que a narrativa histórica assumiu no historicismo alemão assim como as novas modalidades de narrativas estão sendo empregadas nos novos estudos históricos? Poderia me explicar .por favor!

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